Ondas alterosas, revoltadas
Lançam-se contra as rochas tonitruantes
Rochas absortas, nem expectantes
Ondas, mãos verticais, atiradas ao Céu
Em preces perdidas
Insistentes
Desistentes
Ondas homéricas, sanguinárias
Tantas mortes, tantas e várias
Destruições, maremotos, naufrágios
Reais e presságios
Ondas temerosas, monstruosas
Ondulantes onduladas
Desenvoltas espraiadas
E já tão alvas, tão belas
Atiram-se às quentes areias
Que as atraem, quais sereias
Deitam-se e e enteiam-se
Ao calor do Sol
Tão fracas, tão sensíveis
Sensações impossíveis
Calmas, cada vez mais calmas
Esquecidas da revolta e dor
Longínqua a agonia
Beijam a praia
Inspiram a maresia
Sentem o Sol, a areia, o calor
Essa sinfonia
Esse Mar de Amor
É vicioso, empastado, malcheiroso,
Por sua causa
o céu não é azul
o ar perdeu o tom e a limpidez
do mar a espuma preta
empresta, invade o areal
Por sua causa
fazem-se e desfazem-se guerras
criam-se e não se cumprem leis
Por Ele
o homem esquece o outro homem
o homem inventa um Deus
Ó Deus Petróleo
como te adoram e bajulam todos
Ó Deus Petróleo
Como são ricos os que em Ti confiam
Ó Deus Petróleo
Como se ajudam os que Te contêm
Ó Deus Petróleo
Como se desprezam mais e mais os outros
Ó Deus Petróleo
Não quero acreditar em ti
Insisto em acreditar no Homem.
Isabel Sá Lopes
Mar e Fogo
Horizonte de vermelho e fogo
Longe o mar a arder
Mar e céu num abraço apertado
O nosso olhar desfraldado
Absorve esse cenário em brasa
Parece um aquário a arder
E o sol esconde-se a rir
Inferno e Beleza a unir
O infinito tornado finito
A cor, o tom abrasador
O olhar lançado ao fundo da imagem
Tão longe essa real miragem
À beira-mar a praia é um deserto,
Toalhas, bolas, crianças já não há
Cansada sumiu-se a miudagem
Fiquei sentada na areia molhada
A sentir a bênção da água cálida
A sorver o silêncio imenso à minha volta
O mar sem qualquer revolta
Vai e volta devagar
Vai e volta ao mesmo lugar
Ondas pequenas, amenas, voláteis
Sensações periféricas, feéricas
E o mar a arder
E o mar a amar
O sol a chispar fogo
Eu a querer ficar
Eu saber que é tarde
Eu não querer perder
Esse sol primeiro
Esse sol braseiro
Querer, absorver
Esse céu que arde.
Isabel Sá Lopes, 2008
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